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27.8.08

ER 377-2: A estrada da escravatura


ER 377-2: A estrada da escravatura
Nuno Belchior, projecto270

O desenvolvimento local sustentável é mais que uma retórica filosófica. É uma manifestação do mais puro que há em ciência económica.
O protesto das empresas de transporte este ano veio colocar a nú as fragilidades do sistema em que vivemos. Situação momentânea, é certo, mas esclarecedora de uma realidade encaputada à muito. O sistema actual baseado no petróleo é demagógico.
A distância entre dois pontos tem vindo a aumentar de forma assustadora. Os caminhos que percorremos todos os dias são cada vez mais longos, e sombrios. As colinas verdejantes outrora descritas pelos poetas, são hoje monos de betão bordejados por alcatrão, na noite deliniados por cordões de luz. Consumimos e esquecemos, enchendo a nossa paisagem pessoal de monos, que nos tapam e despersonalizam, aniquilando assim o contacto mais íntimo com a Natureza.
Fazêmo-lo intuitivamente, aliás, como tudo à nossa volta “evolui”, porquê ficar para trás…

Sacrificamos a nossa vida e a das gerações precedentes. Destruímos ecossistemas vitais sem, na maior parte das vezes, nos darmos ao trabalho de os conhecer.
Esta estrada é um caminho para nenhures, uma fuga em frente. No caso da ER 377-2, é quem conhece e reconhece, que desvaloriza e destroi.

É tempo de parar, de nos reencontramos como sociedade, e para isso servem os espaços públicos. É tempo de os voltar a utilizar. Contrariar esta necessidade é betonizar o nosso pensamento, anularmo-nos como indivíduos, pois viver em sociedade é bem mais que comprar e vender.

A destruição das hortas das Terras da Costa e da Mata dos Medos, ainda que parcial, é incoerente e reflexo dessa mesma betonização do pensamento.

As terras da Costa produzem vegetais de excelente qualidade, durante todo o ano. Para alimentar o concelho de Almada, bem como Lisboa.
A má gestão e organização do território têm impossibilitado a implementação de um sistema de produção de proximidade, hoje em dia tão falado para combater as alterações climáticas, e fixar as mais valias nas comunidades locais.

Querer acabar com o tráfego intenso é criar politicas concisas de transportes públicos, trazendo o metro de superficie até à Costa da Caparica e à Charneca da Caparica como um dos objectivos obrigatórios para o programa Pólis.
Mais estradas são mais carros, é mais poluição, é menor qualidade de vida, é maior dívida pública, são mais importações, é maior défice.

A Mata dos Medos é o local onde os nossos sonhos se refugiam, é aquele espaço aqui mesmo, que podemos visitar sem porteiro nem horários, onde apenas precisamos de ter tempo, de respeitar o que nos rodeia, de, no fundo, respeitarmo-nos.

Todos, os que aqui vivem e os que visitam a Costa da Caparica, têm o direito a um ambiente saudável e harmonioso, têm direito à praia, ao campo, à comida local, às caminhadas pela Mata, ao andar de bicicleta em segurança, aos transportes públicos acessiveis, têm o direito a uma paisagem, têm direito a uma vida sem muralhas e sem mais alcatrão.
A Arriba Fóssil da Costa da Caparica, a Mata dos Medos e toda a faixa costeira já contribuem mais do que o suficiente para o “desenvolvimento” do País.
Chegou a hora da verdadeira implementação do desenvolvimento local sustentável.
É só querermos.


Costa da Caparica, Agosto 2008